quarta-feira, 12 de novembro de 2014

APDSI apresenta estudo sobre Gestão Documental



A APDSI realizou ontem a “Conferência Gestão Documental e Governança da Informação - O Debate necessário” que coincidiu com a apresentação do estudo “Gestão Documental na Governança da Informação” da autoria do Grupo de Informação Documental (GID) da APDSI.

A conferência juntou quase três centenas de participantes na Torre do Tombo, em Lisboa, cumprindo com o objetivo principal da Associação que pretende colocar na agenda dos decisores da administração pública e da generalidade das empresas nacionais a importância da gestão nos recursos documentais.

Com o aumento da informação não estruturada no seio das organizações e com o recurso cada vez mais recorrente à
cloud, a APDSI está preocupada com a manutenção da informação que circula atualmente, quer em papel, quer em suporte eletrónico. Mas para que a desmaterialização de documentos e processos seja feita e assegurada com segurança, a Associação alerta para o cumprimento do MoReq 2010, um “Modelo de Requisitos para a gestão de arquivos eletrónicos” que, nesta sua mais recente versão de requisitos modulares para gestão documental, pretende garantir que apenas os serviços essenciais sejam capazes de satisfazer os requisitos de qualquer organização, sendo os requisitos específicos de cada uma das organizações incorporados em módulos separados.

O caderno normativo para a gestão documental é da autoria de Jon Garde, vice-presidente do DLM Fórum, que, na conferência da APDSI, começou por lembrar que devemos aceitar que não podemos guardar toda a informação. Devemos sim, em vez disso, saber escolher o que pode ser deitado fora e o que deve ser preservado. «Não podemos resolver estes problemas individualmente mas sim juntos. Os documentos devem poder migrar de sistema em sistema se tivermos a intenção de os preservar por 100 anos», afirmou Jon Garde.

Mantendo intactas as características originais de um determinado registo, como a autenticidade, confiabilidade, integridade e usabilidade, o  responsável pela Fundação “Document Lifecycle Management” defende que é preciso avançar em relação ao muito popular pdf e preservar os documentos em html e java, por exemplo: «Os registos têm de se juntar numa espécie de “atomic record”, algo que crie um documento único com registos em metadata e permita refazer a história desse documento que estará sempre a crescer». A primeira versão do MoReq data de 2001 e neste momento já se caminha para a versão 2015 «com novos módulos, plug ins, extensões, novos serviços e maior integração». A implementação open source é, segundo Jon Garde, um dos objetivos a alcançar.

Rafael António, coordenador do GID da APDSI, introduziu o estudo com um apelo no sentido de que «a tecnologia não pode mais ser considerada isoladamente, tem que ter a componente processual, organizacional e social. Os sistemas têm que passar de gestão documental para preservação digital. É preciso articular as duas gestões de forma harmoniosa».

Segundo explicou o coordenador do grupo de trabalho, na origem da elaboração do estudo esteve precisamente o fato de haver interpretações diferentes sobre o que é gestão documental, gerando a necessidade da criação de um léxico comum. «Não é um trabalho científico; o estudo tem em vista aprender com as boas práticas, por isso qualquer um pode participar e contribuir para o seu enriquecimento futuro», apresentou Rafael António. O estudo, distribuído aos presentes na conferência e disponível em versão digital no sítio na web da APDSI, está agrupado em três partes: gestão documental, gestão por processos de negócio e preservação digital de documentos.

Houve também a preocupação de perceber se a lei obriga a ter esse cuidado especial com os documentos. Nesse sentido, Paulo Ferreira, também do GID, apresentou o levantamento que foi feito sobre a legislação criada nos últimos 20 anos para a gestão documental. Para o GID o quadro legal existente carece de uma nova forma de olhar para os documentos enquanto ativos fundamentais da Sociedade da Informação. Para isso, o grupo sugere a designação de uma entidade com poderes sancionatórios: «Enquanto as pessoas não perceberem que não podem deitar fora documentos com três anos ou menos de idade, enquanto não mudarmos esta maneira de olhar para a documentação, vamos sempre ultrapassar os limites. É preciso perceber que o documento é o resultado de um processo de criação».

António Monteiro, outro membro do GID que contribuiu para o estudo, referiu-se à gestão por processos de negócio (BPM) englobada nas suas seis dimensões: a estratégia, a governação, os métodos, as tecnologias, as pessoas e a cultura, para identificar, desenhar, executar, monitorizar, avaliar e otimizar os processos de negócio para atingir resultados consistentes e alinhados com objetivos da organização. Para António Monteiro, o arquivo de preservação digital vai estar sempre presente em qualquer fase de qualquer processo de compra. A integração técnica e semântica é, no entender deste membro do GID, «fundamental para se otimizar o processo de integração dos dados entre os vários sistemas. Atualmente são necessárias várias intervenções de várias áreas e esses vários processos implicam três ou quatro logins em três ou quatro sistemas diferentes quando na prática só estamos envolvidos num único processo».

Estas “burocracias informáticas” podem ter origem no próprio enquadramento organizacional como defende Beatriz Guimarães, do GID, que considera que «a gestão documental parte de uma visão empresarial do que é um projeto. Com a cada vez maior necessidade de gerir grandes quantidades de informação, a falta de gestão documental origina problemas de perda de informação e aumenta a dificuldade de acesso». O contexto português está, de acordo com a apresentação de Beatriz Guimarães, desadequado das necessidades reais do sistema: «Noto que há falta de reconhecimento da importância desta área para os gestores e falta de recursos humanos com formação. É urgente garantir a gestão de todo o ciclo de vida dos documentos e não apenas na fase ativa do documento, ou seja, daquilo de que estamos a precisar neste momento». Para que esta realidade se possa inverter, os gestores das organizações têm de estar mais sensíveis a este assunto: «A gestão documental tem muito a ver com as pessoas que têm que perceber o que vão ganhar com isto. Por vezes esta é a parte mais difícil, o conseguir fazê-las ver que podem cruzar informação e em que medida isso vai facilitar o trabalho no dia-a-dia», conclui Beatriz Guimarães.

Hugo Sousa Nunes, o outro elemento do GID que contribuiu para o estudo, está preocupado com aquilo que está a ser feito atualmente em termos de preservação documental que «pode não ser suficiente. Hoje em dia é fácil produzir e chegar à informação. A Era em que estamos permite-nos chegar em segundos a informação que há uns anos nos levaria dias a obter. Isto só é possível porque a informação existe mas os novos ambientes digitais são propícios a que subsista sempre um risco óbvio: o buraco negro do séc. XX na recolha digital do conhecimento». Selecionar quem tem acesso à informação, pode ser, segundo o ponto de vista manifestado por Hugo Sousa Nunes, o primeiro passo rumo à preservação da informação.

Ainda na parte inicial da conferência ficou a assunção do compromisso, por parte da Agência para a Modernização Administrativa (AMA), de aprofundar o trabalho já iniciado com a DGLAB - Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas no âmbito da iniciativa Europa 2020. Para Paulo Neves, da AMA, só se consegue desmaterialização e interoperabilidade «quando não se pensar apenas nos documentos mas sim nos processos de trabalho».

Francisco Barbedo, da DGLAB, reconhece que a questão da gestão documental, «não sendo um problema eminente, foi sendo adiado mas agora começa a afetar fortemente as organizações». Francisco Barbedo insiste numa alteração dos mecanismos de trabalho diário reconhecendo que esta é uma medida que «carece de persistência».

Luís Vidigal, da Direção da APDSI
, falou sobre o Enterprise Content Management (ECM) que, segundo o modelo AIIM - Association for Information and Image Management, é constituído por estratégias, métodos e ferramentas utilizadas para capturar, gerir, armazenar, preservar e distribuir conteúdos e documentos relacionados com os processos organizacionais. Luís Vidigal diz que ao seguirmos este modelo «passamos a ter poder sobre os fluxos de informação e a capacidade de torná-los mais transparentes».

Já segundo o modelo da Gartner, o ECM é utilizado para criar, armazenar, distribuir, pesquisar, arquivar e gerir o conteúdo não estruturado (como documentos digitalizados, emails, relatórios, imagens médicas e documentos de office) e, finalmente, analisar a utilização para permitir que as organizações forneçam conteúdos relevantes aos utilizadores onde e quando eles precisem. «Estamos sempre conectados e constantemente a criar documentos e devíamos estar a acautelar a preservação de tudo isto. A Internet das coisas são precisamente documentos que passam a ter vida própria. Isto já está a acontecer», refere Luís Vidigal.

No campo dos casos de implementação, Ricardo Riquito, da AIRC, reforçou a mensagem transmitida durante boa parte da conferência da necessidade de mudanças «estruturais e de regulação a fim de se obter maior rigor, eficiência e sustentabilidade».

Fernando Bernabé, da Glintt, partiu do caso concreto de um dos seus clientes para mostrar como é possível «orquestrar o processo de negócio através da reutilização da informação já pedida uma vez ao cliente».

Para Joana Barroso, da Quidgest, resolver a desorganização de arquivos físicos ou digitais, passa pela «implementação de uma gestão documental de sucesso que deve começar pelo diagnóstico e análise de necessidades, análise do contexto da organização através de entrevistas e caracterização da documentação. Temos que perceber quais as rotinas dos circuitos documentais e só depois implementar um novo processo de gestão documental acompanhado da elaboração de um manual de procedimentos».

Nuno Serra, da Unisys, mostrou como a empresa encontrou iniciativas transversais para várias organizações em simultâneo, através da ferramenta “Fabasoft”, «a única no mercado com certificação MoReq», explicou.

João Brito diz que na VILT os utilizadores finais estão envolvidos no desenho da solução. «Se as pessoas fizerem parte da solução, a solução é também um pouco delas», alertou João Brito que também se referiu à segurança dos documentos mesmo quando são transportados para fora da organização.


A última parte da conferência da APDSI foi reservada ao debate, moderado por Ana Neves, no qual cada um dos representantes das empresas respondeu a problemas concretos apresentados previamente por alguns dos membros do público. A conferência e apresentação do estudo decorreram no Auditório da Torre do Tombo, Lisboa, a que a APDSI chama de “casa dos arquivos”.

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