A APDSI realizou, a 29 de abril de 2015, a conferência intitulada “Certificação Digital: será que é para valer?”.
Na conferência, que decorreu sob a coordenação de Rafael António, responsável pelo Grupo de Informação Documental da APDSI, Joaquim Pedro Cardoso da Costa, Secretário de Estado para a Modernização Administrativa, disse que é preciso contrariar a tendência da sociedade que normalmente não confia na Administração Pública que, por seu lado, também “alimenta” desconfianças com outros organismos públicos, como os ministérios. «O Estado tem muito a fazer nessa matéria mesmo internamente», refere o Secretário de Estado que anunciou, na conferência da APDSI, os esforços que o Governo está a fazer para «desenvolver novas valências para uma maior utilização do cartão de cidadão» que garantam, acima de tudo, «segurança em todas as transações. É o Estado que deve garantir a confiança no mundo digital».
Segundo números oficiais trazidos à conferência por Joaquim Pedro Cardoso da Costa, mais de 80% da população utiliza Cartão do Cidadão mas apenas 1% dos cidadãos tira partido da valência eletrónica do documento. A chave móvel digital é, por isso, o próximo passo que o Estado pretende dar para aumentar esta percentagem, «tendo em conta a estonteante velocidade a que está desenvolver-se a evolução tecnológica», acrescenta o Secretário de Estado.
Rafael António lembrou que, hoje em dia, é o valor económico da informação que prevalece, defendendo, por isso, a desmaterialização como «o caminho a seguir mas antes é preciso garantir que há condições básicas porque se a Justiça não estiver adequada à desmaterialização, não vale a pena. A tecnologia de nada serve se a sociedade não aceitar o digital».
O professor Pedro Veiga, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, esclareceu que a tecnologia se baseia em infraestruturas que são geridas pelos Governos ou empresas comerciais que permitem certificar documentos, portanto «há tecnologia, há enquadramento legislativo, vontade de mudar é que não há, talvez por ignorância, por desconhecimento».
Aproveitando a temática da certificação, o professor lembrou que a utilização dos computadores por parte do cidadão comum mexe com essa questão porque «qualquer utilizador responde sempre “sim” a tudo de cada software que instala».
Ao questionar a legalidade dos certificados digitais no Portugal de hoje, a APDSI contou, também, com o testemunho de Armando Dias Ramos, da Polícia Judiciária, que exemplificou como a prova digital, informação passível de ser obtida ou extraída de um dispositivo eletrónico ou rede de comunicações, já é aceite e tida em conta em processo penal. Contudo, a prova digital ainda está dependente de despacho do juiz do processo e ainda tem muitos aspetos a melhorar: «Para a prova digital ser valorizada tem de ser assegurada a integridade dos dados e a prova é frágil, manipulável, volátil, latente, dissimulável e dependente do tempo. Na lei do cibercrime a legislação é confusa e contraditória». Armando Dias Ramos conclui que, futuramente, a prova digital levanta problemas ao nível da territorialidade.
No seguimento do mesmo pensamento, a advogada Sofia Ribeiro Branco, sócia da Vieira de Almeida & Associados, alertou para o fato de a criminalidade informática ligada à utilização da Internet estar cada vez mais intensificada. «A prova deve ser valorada em Tribunal. É preciso ter cuidado na fase inicial dos processos, quando são pedidas as provas, porque a perícia tem de ter a garantia de que os dados não foram alterados».
Numa perspetiva internacional, Francisco Aranda, do Ministério do Interior espanhol, partilhou na conferência da APDSI como vai ser o novo Documento de Identificação Digital no país. O Documento Nacional de Identidad vai contemplar «novas medidas de segurança, um novo chip, terá capacidade biométrica e um canal seguro autenticado. Há também várias entidades que vão ter interação com o novo DNI», revelou Francisco Aranda. O atual DNI tem o prazo de cinco anos para se poder ajustar às alterações da tecnologia.
Ainda assim, o representante do Ministério do Interior espanhol não escondeu as preocupações que existem como «o aumento do número de ataques, por isso há um serviço pronto a operar 24 horas para dar apoio a eventuais problemas, com especialistas em diversas áreas da criminologia disponíveis, e está prevista a colaboração com organismos internacionais e Administração Pública com ligação à cloud».
Por oposição, Gonçalo Caseiro, da Imprensa Nacional Casa da Moeda (INCM), acredita que o fim dos arquivos físicos não está à vista. «O e-learning nunca vai substituir uma universidade. O papel nunca nos vai abandonar, existe ainda muito papel a circular porque, tipicamente, assinamos papéis. As estatísticas do consumo de papel mundialmente dão conta de que continua a aumentar», apresentou Gonçalo Caseiro. Uma das soluções apontadas para contrariar os problemas que o representante da INCM anteviu, foi o recurso à digitalização com OCR, o sistema de captura automática de dados que permite que os documentos possam ser indexados e pesquisados no futuro.
Francisco Barbedo, da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, afirma que a desconfiança no digital só abrandará quando a desmaterialização for produzida num contexto com boas práticas de gestão documental que passam por saber deitar fora o que não faz falta. Em seu entender, as alterações legais também têm de ocorrer para haver o reconhecimento de repositórios digitais certificados: «Preservar tudo é uma ideia falaciosa, é preciso assegurar a legitimidade do conteúdo digital e, para isso, determinar com consciência o que queremos e podemos preservar. Temos que aprender a lidar com as opções sobre aquilo que vamos ter de deixar para trás».
O Gabinete Nacional de Segurança tem uma lista com todas as entidades autorizadas a fazer certificação digital, segundo Diogo Lacerda Machado, ex-Secretário de Estado da Justiça. «A determinação dos recursos adequados para assegurar maior proficiência deve ser o resultado e não o princípio de um conjunto de escolhas sobre os vários modos possíveis da atuação do Estado na Justiça. Uma nova política, também económica, para a Justiça supõe uma prévia reorientação e reescalonamento nas prioridades da aplicação dos recursos coletivos. Importa, por exemplo, escolher prosseguir no caminho de uma nova distribuição de competências entre o que é público e o que pode ser semipúblico e privado», conclui o antigo representante do Governo.
A conferência, intitulada “Certificação Digital: será que é para valer?”, realizou-se no Auditório da Escola Profissional Gustave Eiffel, Campus Académico do Lumiar, que também assegurou o serviço de coffe-break.
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